Acabou a novela do novo Estatuto dos Jornalistas com a promulgação de Cavaco Silva. Aliás, o diploma já está publicado em Diário da República. Com a conivência presidencial o jornalismo livre e independente pode ter os dias contados. Depois dos desmandos da ERC (Entidade Reguladora para a Comunicação Social), das alterações ao Código de Processo Penal sobre as escutas telefónicas, chega-nos agora o novo Estatuto dos Jornalistas, como corolário da fúria legislativa socialista contra a comunicação social. É certo que houve alguns recuos relativamente ao primeiro diploma mas, no essencial, o absurdo mantém-se. Ainda que remetendo o assunto para o Código do Processo Penal, os jornalistas continuarão sujeitos à discricionariedade dos juízes no que toca à possibilidade de terem de revelar as suas fontes, passando-se assim por cima da importância que o sigilo tem para a existência da própria actividade jornalística; o novo estatuto continua a ignorar o carácter colectivo do trabalho jornalístico na questão dos direitos de autor, revelando-se insensível às profundas alterações que atravessam os media; continuam as sanções aos jornalistas, da competência da famosa Comissão de Carteira, qual tribunal inquisitorial, que pode aplicar (pasme-se!!!) "penas de repreensão" até um ano de suspensão; continua igualmente a obrigatoriedade dos jornalistas aceitarem que se eliminem ou alterem partes dos seus textos, mesmo que os deixem de assinar, caso não se identifiquem com o resultado final, o que conduzirá, naturalmente, à censura interna. Algumas destas situações foram previamente denunciadas como inconstitucionais, porque colidiam quer com os direitos fundamentais dos jornalistas quer com as garantias de liberdade de imprensa. Falou-se mesmo no mais violento ataque à liberdade de imprensa em 33 anos. Em vão. Para Cavaco é matéria de pouca importância. Mas será que o Sr. Presidente da República não percebe que qualquer intromissão do Estado através de órgãos administrativos configurará sempre uma limitação da liberdade de imprensa ao criar um perigoso clima de coacção ou mesmo autocensura? Que isto põe em causa o Estado de Direito, que ele é suposto defender? Não lhe passa pela cabeça que o Estatuto dos Jornalistas nem sequer devia existir, nomeadamente com forma de lei da República!!! Não existe já uma Constituição, a lei geral e a Lei de Imprensa? Não têm os jornalistas dois códigos éticos (o Deontológico e o de Honra), pelos quais se deviam auto-regular, dispensando assim a ERC? Não temos nós tribunais com regras próprias do Estado de Direito para garantir que os jornalistas não estejam acima da lei? Não estão estes ainda sujeitos ao julgamento da opinião pública? Porquê então a criação de uma Comissão da Carteira para o controlo deontológico da profissão? Definitivamente, este presidente e o Estado socrático convivem mal com a liberdade de imprensa. Criaram assim, perante a indiferença geral (excepto, reconheça-se, da classe), um novo tipo de jornalismo, "um jornalismo de cócoras, atento, obediente e obrigado a quem tiver poder". As palavras são de José Leite Pereira, director do Jornal de Negócios, provavelmente a primeira vítima da Comissão da Carteira...
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1 comment:
É a "cooperação institucional" em todo o seu vigor...!
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