Nem só de más notícias vive a paróquia lusitana. Num esforço sem precedentes, com a colaboração da norte-americana Smithsonian Institution (SI), do Ministério da Cultura, da Presidência de Conselho de Ministros, dos Negócios Estrangeiros e da Economia, com o apoio de vários patrocinadores, desde fundações a bancos e grupos económicos, inaugurou, no passado dia 20 de Junho, em Washington, a exposição Encompassing the Globe: Portugal and the World in the 16th and 17th Century, a maior e mais ambiciosa exposição jamais organizada nas Galerias Freer e Sackler, e ainda no Museu Nacional de Arte Africana da SI. Esta exposição é também a mais significativa manifestação da presença cultural de Portugal nos Estados Unidos na última década. A visita à exposição é mais que obrigatória, ainda que não ao alcance de todos, infelizmente (porque não trazê-la para Portugal?). Durante o Verão a zona das galerias e do museu é visitada por mais de um milhão de turistas, pelo que muitos destes seguramente passarão pela exposição. A publicidade na cidade também ajudará, com fotografias da Torre de Belém no metro de Washington, filmes portugueses no cinema, discos nas lojas de música, provas de vinhos portugueses, numa ausência maratona promocional de Portugal e de sedução dos americanos pelas coisas lusitanas. Numa altura em que o tema da globalização e do diálogo de culturas e civilizações está na ordem do dia, esta exposição ganha uma importância acrescida, ao divulgar aquele que foi talvez o maior contributo de Portugal para a História Mundial: os Descobrimentos, e com eles o primeiro exercício de globalização à escala mundial. A mostra servirá também para esclarecer os equívocos americanos relativamente ao papel dos portugueses na criação do chamado Novo Mundo, por comparação com os espanhóis. Nos currículos escolares fala-se um bocado das viagens portuguesas ao longo da costa africana mas apenas porque isso conduziu à chegada de Vasco da Gama à Índia. Depois disso, nada, um imenso deserto. Portugal pura e simplesmente desaparece. Ora, como sabemos, os marinheiros portugueses aventuraram-se pelas águas internacionais para estabelecer uma rede comercial global que se estendia da Europa para o Brasil, África, o Golfo Pérsico, Índia, Sri Lanka, Indonésia, China e Japão. Este império marítimo ligou as civilizações de todos os continentes conhecidos até então, transformou o comércio e iniciou uma troca cultural sem precedentes. É precisamente sobre isto que a exposição se debruça, sobre o império comercial e marítimo estabelecido por Portugal a partir do século XVI, com particular destaque para os novos tipos de objectos artísticos que foram produzidos pela fenomenal rede de entrepostos comerciais que os portugueses criaram nesta altura. Como disse Jay Levenson aos jornais, um dos comissários, juntamente com Julian Raby, "em África, como na Índia ou no Japão e na China, os portugueses encomendaram obras de arte para o mercado europeu. Portugal estava na vanguarda da criação da arte mundial". Velhos tempos, que importa não esquecer. Estas obras de arte estão agora expostas, divididas por vários núcleos, com peças provenientes de mais de 100 museus e colecções privadas de dezenas de países. Entre as peças mais emblemáticas salientam-se raros mapa-múndi do século XVI de cartógrafos portugueses e florentinos, objectos de caça e utensílios de cozinha esculpidos em osso e madeira provenientes da África Ocidental e Central, imagens religiosas e estátuas em terracota do Brasil, instrumentos científicos fabricados por missionários jesuítas para a corte imperial chinesa ou uma série de objectos que outrora estiveram expostos nos chamados "gabinetes de curiosidade", ou “câmaras de maravilhas”, como também eram conhecidos, coleccionados por algumas das mais importantes casas reais ou ducais europeias como os Médicis, os Habsburgos ou a nossa D. Catarina de Bragança, mulher de D. João III. Das peças portuguesas encontramos o Ecce Homo, de finais do século XVI, ou o retrato de Afonso de Albuquerque, vice-rei da Índia, ambas do Museu Nacional de Arte Antiga de Lisboa. Enfim, um excelente retrato da primeira globalização, a "portuguesa", junto do actor máximo da actual globalização, a "americana".
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