Pelos vistos todos, ou quase todos. Praticamente ninguém quer um referendo ao "novo" tratado da União Europeia. Já se percebeu que Cavaco não o quer. Sócrates também não, fazendo assim o contrário daquilo que consta no programa do governo. Mas a desfaçatez não fica por aqui. Parte da oposição está dividida, com um PS a várias vozes e um PSD partido entre barrosistas, mais papistas que o próprio papa, e a posição de Marques Mendes. Os argumentos contra o referendo são delirantes, como se fossemos todos estúpidos e não percebêssemos o que esta gente quer. Uns alegam que o tratado é "simplificado", logo, não vale a pena. Como não há profundas alterações "não há razões para haver referendo" (José Matos Correia). Mas ignora o ilustre deputado do PSD e antigo chefe de gabinete de Durão Barroso que este tratado "simplificado" não simplificou coisa nenhuma? Que o essencial da Constituição rejeitada há dois anos pela França e pela Holanda permanece? Que o emaranhado de disposições que hoje governam a Europa continuará? Que aquilo que importava resolver foi adiado para as calendas gregas? Como deputado não devia ignorar ou então toma-nos por parvos. Outros, do alto da sua sabedoria, invocam regras do direito internacional do século XVI para justificar o injustificável, neste caso a cambalhota do governo, como se o direito internacional fosse uma coisa estática e não evoluísse de acordo com as necessidades e mutações das sociedades. E acrescentam: "Temos que ser pragmáticos e ajudar o governo a concluir a tarefa para a qual foi investido pelo Conselho Europeu. Isto não é matéria partidária" (Martins da Crus, ex-MNE), como se os partidos não pudessem/devessem discutir estas coisas. A hipocrisia não fica por aqui, nem a vergonha, quando se afirma que "o referendo só é legítimo para as questões menores" (Sérgio Sousa Pinto, eurodeputado do PS). Questões menores? Mas vamos referendar o quê? O tamanho dos carapaus? Os implantes mamários? A inteligência de Sousa Pinto? Está tudo dito, e percebido. Esta gente, com a conivência de Cavaco e Sócrates, não quer discutir a Europa. Esta gente só quer uma Europa, a "sua" Europa, feita de um "pensamento único". Uma Europa fruto duma engenharia política sem pés nem cabeça, desligada da realidade, enredada numa burocracia kafkiana, sem legitimidade democrática. Contribuindo assim para um divórcio que poderá revelar-se fatal à Europa prudente dos pais fundadores. Como ultrapassar o crescente alheamento e até hostilidade das opiniões públicas face à UE? Como resolver a "ilegitimidade" democrática das suas instituições? Como resolver a opacidade do processo comunitário de decisão, que afasta as pessoas e afecta a imagem da UE? Como diminuir a abstenção nas eleições para o Parlamento Europeu? Como superar o patriotismo económico de Sarkozy? A resposta não está no chico-espertismo da generalidade das criaturas que nos governam ou emitem opinião, que preferem fazer as coisas pela calada, fugindo a sete pés do referendo. Como se a solução não estivesse aqui, na consulta popular, aproximando os cidadãos das instituições europeias, na discussão sem receio da Europa, no confronto das diferentes estratégias de pensamento político, na desmontagem da propaganda oficial. A vontade política dos povos e das nações merece mais respeito e outros políticos.
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