Wednesday, June 15, 2011

NOVAS PÁGINAS DA REPÚBLICA (9) - O Modernismo Artístico...

É pelo humor, pela caricatura e pela ilustração que o modernismo penetra em Portugal. O palco dessa primeira ruptura com os padrões naturalistas que ainda predominam após o 5 de Outubro de 1910, estéticas que o novo regime não questiona, são as exposições de humoristas realizadas em Lisboa, em 1912 e 1913.

Os jovens artistas, como Cristiano Cruz, Almada Negreiros, Jorge Barradas, Stuart Carvalhais, Emérico Nunes, Alfredo Cândido, Francisco Valença, Amarelhe e Rocha Vieira, trazem consigo um novo traço, mais estilizado, que integra muitas inovações pós-art nouveau, revelando pela primeira vez em Portugal as influências do modernismo artístico; mas trazem também consigo novas temáticas, que não o político, optando muitas vezes pela crítica de costumes sociais e pela ridicularização dos hábitos das classes médias e dos novos-ricos.

A segunda ruptura modernista dá-se com o regresso dos “parisienses”, como Eduardo Viana, Amadeo de Souza-Cardoso ou Guilherme Santa-Rita, obrigados pela Grande Guerra a regressar a Portugal. Eduardo Viana, com uma exposição na Sociedade Nacional de Belas Artes, em 1914, evoca o abalo causado pela obra de Cézanne, de quem se mostra tributário, ao mesmo tempo que revela a influência da conversão cubista de Picasso e Braque, ainda a fazer estragos pela Europa.

Guilherme Santa-Rita, que se chama a si próprio Santa-Rita pintor, autoproclama-se ainda representante do futurismo para Portugal. Variante da renovação modernista, o futurismo glorifica uma arte inspirada no progresso tecnológico, na maquinaria, na velocidade e em tudo o que o senso estético até então condenava: as perturbações psíquicas, a perversão sexual ou a guerra, formas de atingir uma vivência que se crê total e superior.

Amadeo de Souza Cardoso é talvez o pintor que melhor incorpora o espírito do tempo, assimilando a explosão vanguardista em todo o seu ecletismo. Assumindo-se como “impressionista, cubista, futurista, abstraccionista, de tudo um pouco”, a sua obra atravessa todas essas escolas e outras não catalogadas. Sem disso ter consciência, o país acaba de receber o seu mais extraordinário criador plástico.

As ideias políticas dos modernistas e futuristas vão chocar com tudo o que a I República defende, o que dificulta a sua implantação e disseminação sólida. Mas é no meio das suas vicissitudes que o modernismo artístico português vai desaparecer, quase de forma tão fulminante como surgira. Primeiro, atingido pela tragédia: Santa-Rita e Amadeo morrem pela doença, em 1918; depois, bloqueado pela tradição: Cristiano Cruz, desiludido com o conservadorismo dominante, abandona a carreira artística e exila-se em África; Almada, decepcionado pelo imobilismo lusitano, parte para Paris; Viana, apesar do talento, confina o seu modernismo a limites figurativos.

No fim da década, a vanguarda portuguesa encontra-se pulverizada, como se nunca existisse ou não passasse de um mero equívoco.

PS. O retratado é Francisco Cardoso, num óleo sobre cartão de Amadeo de Souza Cardoso, c. 1912 (O original, de 35 x 27 cm, está no Museu Municipal Souza-Cardoso, em Amarante).

2 comments:

Amadeu Carvalho Homem said...

Muito interessante ! Estarei atento a novas "postagens" sobre assuntos ligados à Caricatura em Portugal. Cordiais saudações ! Amadeu Carvalho Homem

Álvaro Costa de Matos said...

Caro Prof. Amadeu Carvalho Homem,

Agradeço o seu comentário, que muito estimo. Um Abraço,