Wednesday, July 6, 2011

NOVAS PÁGINAS DA REPÚBLICA (10) - O Modernismo Literário...

No último post desta série de “páginas” sobre a I República vimos como o modernismo rompeu com os padrões naturalistas que ainda predominavam nas artes plásticas após o 5 de Outubro de 1910. Mas a ruptura não foi apenas nas artes; ela dá-se igualmente nas letras, sobretudo com o futurismo. O seu mais consistente defensor foi Fernando Pessoa, então um obscuro poeta e escritor, agente comercial num escritório da baixa lisboeta, inventor nas horas livres de personalidades imaginárias, heterónimos a que dá a autoria de muitos dos seus trabalhos. Será ele a fazer durante a I República a apologia do futurismo na forma teórico-literária, nomeadamente com Álvaro de Campos.

Outro poeta que vai alinhar na defesa do futurismo é Mário de Sá Carneiro, que, ao contrário dos pintores, resolve suportar a guerra na mais cosmopolita das cidades, Paris. Com o dinheiro da família, financia em 1915 os dois únicos números da revista Opheu, a mais forte afirmação modernista nacional. Pessoa e Sá-Carneiro são os directores do número 2, onde se torna clara a opção futurista na glorificação de uma literatura inspirada no progresso tecnológico, na maquinaria, na velocidade ou mesmo nas perturbações psíquicas.

Não contam, porém, com a reacção conservadora nem com a indiferença nacional, contra as quais acabam por esbarrar. O principal protagonista dessa reacção será o escritor Júlio Dantas, que, na Ilustração Portuguesa, menosprezará a saída de Oprheu. A resposta aparece em 1916 na extrema violência verbal do Manifesto Anti-Dantas e por Extenso, de Almada Negreiros, a mais radical condenação do academismo estético-literário em Portugal.

Pouco depois, o mesmo Almada Negreiros e Santa-Rita anunciam a criação do Comité Futurista de Lisboa, e em 1917, Almada apresenta no Teatro República, na capital, com grande espalhafato, o seu Ultimatum Futurista às gerações portuguesas do século XX. Segue-se o número único de Portugal Futurista, glorificando Santa-Rita mas reproduzindo também obras de Amadeo de Souza Cardoso e um texto de Álvaro de Campos – Mandado de Despejo aos Mandarins da Europa – que constitui o sustentáculo literário do futurismo nacional.

Talvez mais por provocação que por convicção, as ideias políticas dos futuristas, que vão desde o ultramonaquismo e reaccionarismo ao integralismo lusitano, chocam com tudo o que a República defende. Talvez por isso, no fim do decénio, a vanguarda portuguesa encontra-se pulverizada, como se nunca existisse ou não passasse de um mero equívoco. Resta a voz solitária de Pessoa, ele que em 1918 dissera que toda esta geração modernista “nenhuma influência” teve na vida portuguesa – “porque não há vida portuguesa”.

PS. No cimo, capa da revista Orpheu, 1 (1915).

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